Thiago Padovan, Inteligência Democrática (19/06/2024)
A teoria da ferradura é um conceito político que sugere que a extrema esquerda e a extrema direita, em vez de estarem em lados opostos de um espectro político, estão na verdade mais próximas em termos ideológicos e táticos do que possa parecer.
Imagine o espectro político como uma ferradura: as extremidades se curvam uma em direção à outra, simbolizando as semelhanças entre os movimentos extremistas de esquerda e direita.
Contexto histórico
As raízes da teoria da ferradura podem ser observadas desde o século XX, particularmente após a Segunda Guerra Mundial. Teóricos políticos observaram que regimes totalitários, fossem fascistas ou comunistas, frequentemente utilizavam métodos semelhantes de controle, como propaganda, supressão da dissidência e um governo autoritário centralizado.
Isso levou à suposição de que os extremos em ambos os lados do espectro político podem exibir comportamentos bastante próximos, apesar de suas fundações ideológicas diferentes.
Exemplos políticos modernos
Na política contemporânea, podemos observar casos onde a teoria da ferradura parece se manifestar claramente. Por exemplo, o apreço por ditadores não mais respeita a divisão entre esquerda e direita. Alguns anos atrás, quando Viktor Orban, um autocrata, se reelegeu na Hungria, tanto Donald Trump, da direita, quanto Nicolás Maduro, da dita esquerda, saudaram a vitória do parceiro.
A aproximação com a ditadura russa também não respeita essa mesma divisão. Tanto Lula, da esquerda, quanto o próprio Trump, da direita, são parceiros ideológicos de Putin, cada vez mais declarados. Além disso, a direita não democrática brasileira também demonstra simpatia pelo ditador russo.
Nos Estados Unidos, pudemos acompanhar casos de grupos autodeclarados anti-fascistas da esquerda identitária promovendo manifestações em Universidades que são muitas vezes carregadas de apoio ao Hamas, uma organização terrorista que discrimina e mata LGBTs.
Na Europa, observamos declarações contra a União Europeia e a OTAN não apenas da esquerda, como era mais comum, mas também da direita, exemplificadas por figuras como Robert Kennedy Jr. Na Alemanha, um novo partido está surgindo, unindo pautas que atraem tanto a extrema esquerda quanto a extrema direita. Pesquisas recentes mostram que esse novo partido está cativando um público que, até recentemente, parecia impossível ver unido.
No Brasil, também vemos exemplos semelhantes. Observamos um alinhamento velado entre partidos antagônicos, como o PL, de direita, e o PT, de esquerda, em pautas que beneficiam ambos. Eles se uniram em ações contra Sergio Moro, pelo fundo eleitoral, contra operações anticorrupção e na recente polêmica sobre a PL do aborto. Enquanto deputados do PL puxaram o projeto, também vimos o aval do governo para acelerar a aprovação da urgência na votação.
Essas duas forças também se alinham em seus métodos de atacar e deslegitimar a imprensa, dividir a sociedade em "nós contra eles" (sendo que o "nós" e o "eles" para cada um desses grupos são diferentes), utilizar a mentira como método de manipulação da opinião pública e sufocar rapidamente qualquer adversário que venha do campo democrático.
Críticas à teoria
Embora a teoria da ferradura ofereça uma perspectiva interessante, ela não está isenta de críticas. Alguns argumentam que ela simplifica demais a análise política. Críticos sugerem que, ao focar nas semelhanças entre os extremos, podemos ignorar as diferenças significativas que definem essas posições políticas.
Realmente, nenhuma teoria consegue explicar a complexidade das relações políticas e humanas. Precisamos olhar para isso de forma crítica, mas já não dá mais para ignorar esses fatos e como eles vêm acontecendo de forma cada vez mais frequente e explícita.
A teoria da ferradura fornece uma nova lente para observar o extremismo político, lembrando-nos que as fronteiras entre a extrema esquerda e a extrema direita podem, às vezes, se fundir de maneiras inesperadas.