Contra a tirania
Bruno Fernando Riffel, Inteligência Democrática (27/10/2025)
A nova onda tirânica avança em surdina, coberta por um manto de legalidade. Leis são moldadas, órgãos públicos dobrados, consciências entorpecidas. Uma força que surge de mansinho, consumindo a nossa frágil democracia. E que ganha espaço quando a sociedade se acomoda e o vínculo social se rompe; quando governantes aplicam doutrinas e as palavras perdem legitimidade.
Onde há comunidade, há fôlego. O antídoto floresce na escuta, no respeito e na ação comum, nas relações e nos gestos diários. A democracia respira em laços, convivência e redes de colaboração efetiva. Nela pulsam a livre reflexão e expressão. Representa o direito de qualquer um, jamais o domínio dos muitos sobre poucos.
O capital social — para consolidar-se — requer escuta, diálogo, respeito e partilha. Que se lide com divergências sem transformar o outro em inimigo, criando, para proteção, associações, cooperativas, grupos culturais e clubes de bairro. São cidadelas de autonomia e de maturidade política onde se aprende a agir de modo coletivo e a conviver com a diferença.
Um governo precisa ser visto, debatido, examinado, controlado. Sua representatividade exige equilíbrio entre os poderes e vigilância constante. O poder civil deve coordenar as forças armadas e a polícia. Quanto mais o mando se reparte — entre cidades, estados e associações —, mais sólido se torna o corpo social.
Toda estrutura política reflete o modo como a autoridade circula entre as pessoas. Quando o poder se concentra, o medo cresce; quando se reparte, a convivência se fortalece. A tirania alimenta-se do medo e da violência. Seu prenúncio que destrói o convívio está no discurso do ódio, na retórica que divide o mundo entre “os bons” e “os inimigos”.
Sistemas que acumulam recursos em poucas mãos criam terreno fértil para a corrupção e o despotismo. O caminho oposto é a transparência — o ar que sustenta a vida pública — menos privilégios, punição justa, responsabilidades expostas à luz do dia.
A resistência à tirania nasce nas bases: praças, escolas, laços entre vizinhos. Ali germina a cultura cívica, o gosto pela participação e a vacina contra o populismo — movido pela raiva, pela ilusão e pela promessa fácil. A cura está na ação coletiva: multiplicar contatos e fortalecer as redes, ampliar o espaço da palavra. Em associações, clubes e grupos comunitários aprende-se a debater, ceder e construir em conjunto. Até os vínculos mais frágeis — uma conversa, um projeto partilhado — sustentam o espírito público.
A aprendizagem política nasce da prática e o cidadão que participa deixa de ser súdito. Quando a imprensa cumpre seu papel, a diversidade de vozes obriga o mando à responsabilidade. Onde a informação se concentra, o ar público se rarefaz.
A vida brota da conversa, do vínculo humano, da convivência solidária e da qualidade do diálogo entre as pessoas. É esse exercício contínuo que permite que a liberdade esteja entre nós.



