Para vencer uma eleição para prefeito
Sob a terceira onda de autocratização que nos assola desde o início deste século, sobretudo depois da eclosão da segunda guerra fria, a partir do início da terceira década, a política está tribalizada. Tribalizada e polarizada. Os sem-tribo têm muita dificuldade de enfrentar qualquer disputa na política institucional, sobretudo eleições para cargos majoritários, se não estiverem claramente identificados ou amparados por um dos polos em confronto.
Claro que é possível tentar escapar desse condicionamento se o sujeito político envolvido na disputa já possuir altos índices de popularidade, em geral produzida por broadcasting (como no caso de Datena em São Paulo, cujas tentativas fracassaram até agora e de outros apresentadores de TV, como Mauro Tramonte, em Belo Horizonte, que atualmente lidera as pesquisas). Mas, mesmo assim, com o desenvolvimento do jogo político bruto, "cavalos peruanos" - aqueles que costumam sair na frente (caso clássico, por exemplo, de Russomano), dando a impressão de que vão vencer - são processados (moídos) pela máquina institucional da disputa e acabam sendo ultrapassados por atores políticos que contam com apoio orgânico de alguma tribo ou de vários tribos. Temos casos de sem-tribo que venceram, mas depois - atacados por tribos de vários lados - perderam seus postos e sua influência política e caíram no ostracismo, como João Dória (independentemente dos seguidos erros políticos que cometeu).
É possível disputar com chances de vitória, sem tribo, sem se alinhar a um dos lados da polarização e sem ser uma celebridade já conhecida e reconhecida, mas só se houver um fato extraordinário que impacte a opinião pública (por exemplo, uma catástrofe em que o candidato surja como uma espécie de salvador e adquira aquele tipo de fama fulminante, construída num processo relâmpago e, mesmo assim, se isso ocorrer no timing perfeito, naquele momento exato da disputa em que não dê mais tempo para as tribos adversárias destruirem sua reputação).
Ou, então, depois de várias tentativas, ficando conhecido por extensas parcelas da população que, mais adiante, podem ser tentadas a dar ao pretendente uma chance, fazendo-lhe uma espécie de justiça reparativa. Mas isso não é certo (não aconteceu, por exemplo, no caso de Ciro Gomes) e, para que venha a ocorrer algum dia, é necessário se manter conectado a uma rede com um e dois graus de separação com um número crítico de nodos que seja capaz de se irradiar para outros graus ampliando sistemicamente simpatias e apoios suficientes.
Para tanto, via-de-regra, o candidato tem que se comportar como um concurseiro profissional, aquele que disputa poucas vagas para um cargo com milhares de pretendentes e se submete às provas durante anos seguidos até conseguir passar - ou não (como Eymael, que sempre concorreu para permanecer no palco ou ser recebido nos gabinetes de Brasília, não propriamente para ganhar)! O candidato acaba virando um profissional de campanha - ou um profissional de perder eleições.
Não basta ter recursos (dinheiro para fazer campanha). Não basta montar grandes equipes profissionais contratadas. É necessário ter pessoas voluntárias. (É por isso que Lula jamais abandonou a militância petista, o muque decisivo de suas campanhas).
Claro que sempre aparecerão exceções. Afinal, é preciso confirmar a regra.
Esta nota foi redigida por Augusto de Franco, do staff de Inteligência Democrática.