Reflexões sobre o atentado a Trump
Em que o atentado ao Trump pode nos fazer refletir? Em primeiro lugar, parece até um evento programado, não no sentido da teoria conspiracionista que imagina logo uma força para além das forças que estaria agindo em favor ou do sistema ou do próprio Trump, mas no sentido de que a espetacularização da política, com o advento das mídias sociais cada vez mais sedentas por engajamento, cria a necessidade de um fato bombástico a todo momento.
Um tiro num candidato com chances de se tornar o próximo presidente dos Estados Unidos é ao mesmo tempo inesperado pela dimensão dramática do evento e esperado como parte do jogo de engajamento que o algoritmo permite manipular. Que fique claro, no entanto, que a verossimilhança de uma programação de eventos a alimentar uma mídia faminta de sensacionalismo não altera a veracidade do fato em si. Há um atentado, há tiro, há o ferimento no candidato. O que quero dizer com isso é que o fato político por assim dizer é outro.
Em segundo lugar, há a pressa por vaticinar uma consequência do atentado e o primeiro que vem à mente é o resultado da eleição, como a nos fazer lembrar que o resultado de uma eleição é muito mais importante do que qualquer outro aspecto de uma democracia. E essa pressa pode nos dizer muito sobre o nosso gosto pela aposta, pelo jogo, mas diz pouco sobre o que está em jogo.
Por fim, a reação de Biden, o principal oponente na esfera eleitoral que, em vez de alimentar uma oposição polarizada, traz para o campo de discussão o tema da possibilidade de resolver nossos problemas de maneira pacífica, condenando atentados que se tornam mais comuns e que afetam não uma pessoa em si, mas o ambiente democrático. Em oposição a um mundo cada vez mais “imediatizado” pelo algoritmo que nos escapa, o que Biden faz é alertar para uma comunicação que traga a política de volta em contraposição a um campo de guerra midiático alimentado por populismos que facilmente descambam para a violência.
Esta nota foi redigida por Rafael Ferreira, do staff de Inteligência Democrática.
Um outro aspecto a refletir: estratégias de posicionamento e comunicação que, por um lado, apresenta seu candidato como um ungido lutando contra o representante de uma conspiração global satânica e, pelo outro lado, apresenta seu candidato como a única alternativa democrática legítima contra o principal representante da barbárie. Como se espera que uma campanha em muito orientada por esses posicionamentos não tenha altíssima probabilidade de resultar em violência política por parte de partidários?