Eis o que penso até agora.
As plataformas de mídias sociais não têm nenhum mandato para tirar do ar conteúdos que sejam interpretados (por quem?) como atentados ao Estado democrático de direito, fake news, desinformação e discurso de ódio.
Numa democracia é lícito propor o fim da democracia (mas não é lícito incitar a derrubada violenta do regime).
Numa democracia é lícito mentir (mas não é lícito cometer calúnia, injúria, difamação e nem levar pessoas a cometer atentados contra a vida e a liberdade e a infligir sofrimentos a outros seres humanos e sencientes).
Numa democracia nenhum cidadão tem a obrigação de dar informações corretas sobre qualquer coisa (mas não pode, voluntaria e dolosamente, dar informações falsas que causem prejuízos a terceiros; como, por exemplo, a de que vacinas não funcionam ou causam doenças).
Numa democracia nenhum cidadão está proibido de expressar seu ódio: contra o regime, contra qualquer autoridade e contra qualquer pessoa (desde que não incorra nos crimes já previstos em lei, alguns dos quais mencionados aqui).
Esses juízos são extremamente complexos e só podem ser feitos por quem tem mandato público (embora não eletivo) para tanto - como os membros do poder judiciário. Não se pode terceirizar essa avaliação para empresas privadas.
É razoável proibir as mídias sociais de impulsionar publicações do que não é lícito (como se exemplificou acima)? Sim, mas como é que seus algoritmos conseguirão interpretar o conteúdo de uma publicação distinguindo uma coisa da outra? Nos casos de nudez, pornografia, drogas, jogos, assassinato, suicídio e mutilação é mais fácil. Nos casos citados aqui - atentado ao Estado de direito, fake news, desinformação e discurso de ódio - é dificílimo; a rigor impossível. Não há, por enquanto, nenhuma IA que consiga fazer isso de modo inequívoco. E se a avaliação for entregue a um funcionário humano, temos também um problema, sobretudo quando o tema é político e o julgamento é subjetivo (ou seja, depende da orientação ideológica do sujeito).
Imaginem agora o problemão que seria o governo, mesmo em parceria com o parlamento e o judiciário, nomear um comitê de notáveis para interpretar o que lícito e o que não é por maioria. Ou esse comitê seria composto pelos arcanjos Miguel, Rafael, Gabriel e Samuel ou viraria um campo de disputa política acirrada (e polarizada - se é que não seria composto apenas por governistas ou por pessoas vulneráveis à pressão dos poderes).
É um problema novo. Tudo indica que o assunto precisa ser mais discutido antes de ser resolvido por uma canetada da suprema corte. Tem de ser mais debatido, sobretudo, pela sociedade e pelo parlamento (que é o lugar certo para aprovar leis).
Na minha opinião todos deveriam ser livres para postar o que bem entender, mas deve ter consciência que deverá arcar com as consequências nos termos da lei. Se alguém postar alguma coisa sobre minha pessoa que seja mentira ou me ofenda, contrato um advogado e vamos em frente. Estão preocupados em regular a internet, para evitar fake news, e o que é comentado, verdades ou mentiras, nas mesas de bar? E todas lorotas que rolam nas salas de sinuca, barbearia, salão de beleza, saunas, balcão dos bares, ponto de ônibus, no taxi, no Uber etc...?