Um segredinho de alguns institutos de pesquisa
VOU CONTAR APENAS UM SEGREDINHO DE ALGUNS INSTITUTOS DE PESQUISAS
Roberto Reis, X (26/12/2025)
A Margem de erro é onde a magia acontece. A Ponderação é o Cofre de tudo.
Pesquisa não nasce prontinha. Ela nasce meio torta. E depois [vai] sendo endireitada...
O nome bonito disso é ponderação pós-coleta. O nome real deveria ser: a caixa-preta onde o dado bruto precisa se transformar em resultado publicável.
E é aqui que o contratante entra, mas sem aparecer. Não são todos os institutos. E nem em todos os momentos.
Isso costuma ocorrer 12, 9, 6 meses antes da eleição para viabilizar “alguém”.
O contratante não precisa dizer “me favoreça”.
Basta dizer, algo do tipo “eu quero assim o público alvo”, “eu quero assim o micro recorte”, “eu quero assado a leitura”. Tudo sutil.
O resto é “ajuste” do instituto.
1) O que o contratante compra de verdade
Ele compra três coisas:
1) Dados para expor em uma vitrine.
2) Narrativa de notícias.
3) E um gráfico que empurra comportamento.
É isso. Quando o contratante é um partido, geralmente é isso ai.
Com isso ele consegue:
Criar clima de otimismo.
Induzir voto útil.
Aumentar adesão.
Convencer aliado.
Cacifar negociação.
Enquadrar adversário como inviável.
Pesquisa vira arma de viabilização ou inviabilização.
E isso não exige fraude explícita. E liberdade de metodologia. Alias, é exatamente o que a “ponderação” entrega.
2) Margem de erro não é o problema
É o álibi para tal. A margem de erro “clássica” fala sobre isso:
Erro amostral.
O erro de entrevistar parte e não o todo.
Mas na prática:
Quem você alcançou.
Quem recusou.
Quem mentiu.
Quem você substituiu.
Como você ponderou.
Como você recortou.
Como você publicou.
A rua não é perfeita.
Empurra-empurra.
Sol quente nas costas.
Mal humor do entrevistado e do entrevistador.
Meta e horário para bater.
Ali é uma pescaria de rede. Vem pneu, vem lixo, vem dado confuso.
Ou seja. A margem de erro se torna perfeita para virar “um escudo”.
“Está dentro da margem.” Sim.
Como funciona isso?
3) A FAMOSA ponderação pós-coleta: a cozinha onde se tempera tudo
Amostra real nunca bate com o mundo real. Um instituto precisa fazer um “micro-universo” do Brasil, da Cidade, do Estado.
Mas...
Falta jovem.
Falta rico.
Falta gente que não atende.
Falta gente que não abre o portão.
Falta o eleitor que tem raiva de pesquisa.
É a vida real.
Uma kombi cheia de entrevistadores com discos ou pranchetas sai para a rua 8h da manhã e tem que estar em casa 5h da tarde.
Os dados vem brutos. Então o instituto então calibra.
Cada entrevista recebe um peso. Algumas pessoas passam a valer menos que 1. Outras passam a valer 3, 5, 10.
É, é isso mesmo. É metodologia. É a única solução.
Quem faz isso é um professor inteligente, nerd, atento, experiente, no conforto do ar condicionado.
Esse cara, o revisor, é o de mais alta confiança do instituto. Geralmente é um veterano. O dono do instituto confia tudo nele.
É ele o responsável, veja bem, pela “ponderação”.
Exemplo claro. Você entrevistou 1000 pessoas. Mas só 120 são jovens.
No universo real, jovens deveriam ser 200. O instituto corrige.
Cada jovem passa a valer 200 dividido por 120. Ou seja, 1,67.
Não acredita?
Meu caro, a pesquisa tem data para sair. Budget para ser respeitada. Multa em contrato.
A ponderação resolve isso tudo ai.
Se jovens preferem mais um candidato, esse candidato sobe.
Sem mudar uma única resposta.
Ele sobe porque você aumentou o volume de quem já estava falando a favor.
Isso é legítimo quando bem feito. E é altamente manipulável quando bem vendido. Depende muito do contratante.
4) Os botões invisíveis que mudam tudo na ponderação
Aqui está o segredo industrial.
Não é um botão único, são vários botões pequenos, suaves, bem ajustados.
E pequenos botões somados viram grande diferença.
4.1 A escolha da régua
Para ponderar, você precisa de uma base. Pode ser distribuição de população. Pode ser distribuição de eleitorado.
Uma régua puxa para um lado. A outra puxa para outro.
Ambas podem ser defendidas como técnicas. E é aí que mora o jogo.
Se o contratante é forte em um perfil que uma régua enfatiza, adivinhe qual régua vira “a mais adequada”.
4.2 A escolha das variáveis
Ponderar por sexo e idade é básico.
Mas quando você adiciona escolaridade e renda, você entra no terreno pantanoso. Renda é autodeclarada. Oscila.
É mentira por vergonha ou por pose. Escolaridade também tem um ruído danado.
E mais importante. Ela costuma estar colada em preferência política.
Então o instituto decide:
Vai ponderar por escolaridade ou não.
Vai ponderar por renda ou não.
Vai cruzar tudo ou vai simplificar.
Cada escolha muda o resultado. Como saber? Simulando. Existem softwares próprios para o instituto.
Você vê uma prévia na tela na hora.
E quase ninguém consegue auditar sem o relatório técnico completo. Esse sim, só de posse do instituto.
4.3 O tamanho das células e o perigo do entrevistado que vira multidão
Quando você cruza: idade, sexo, região, escolaridade, renda você cria células pequenas.
Às vezes a célula tem 3 pessoas. Às vezes tem 1.
Se aquela 1 pessoa virar peso 8, ela deixa de ser respondente.
Ela vira cabo eleitoral estatístico. Isso explode um conceito que raramente é mostrado: tamanho efetivo da amostra.
Você anuncia 2000 entrevistas. Mas depois de pesos extremos, a amostra se comporta como 900. Ou 700.
A margem real aumenta.
O rodapé continua vendendo a margem do número bruto. É isso, sacou?
4.4 Limites de peso e o teatro do “trim”
Um instituto responsável limita pesos extremos para reduzir instabilidade.
Mas aqui existe outra zona, digamos, cinzenta.
Limitar muito pode achatar segmentos que favorecem um lado.
Limitar pouco pode inflar segmentos que favorecem outro.
E isso é “vendido” como técnica. Metodologias diferentes entre institutos.
Quando você vê muita divergência entre bruto e ponderado, pergunte:
quais foram os pesos máximos e mínimos?
quantos entrevistados ficaram com peso acima de 3?
qual foi o tamanho efetivo final?
Se não responderem, você já entendeu o suficiente.
4.5 O recall do voto anterior: a arma mais sofisticada
Perguntar “em quem você votou na última eleição” parece genial. E é perigosíssimo.
Porque o eleitor mente. SIMPLES ASSIM, O ELEITOR MENTE. Ou esquece. Ou reescreve a própria história.
Muita gente diz que votou no vencedor. Muita gente esconde o voto real.
Se você pondera para encaixar a amostra no resultado passado oficial, você força o presente a caber no passado.
Isso pode:
inflar resiliência de um grupo antigo
achatar crescimento de um outsider
criar uma fotografia velha com moldura nova
De novo. Dá para defender tecnicamente. E dá para dirigir politicamente.
4.6 Votante provável embutido em peso
Você não precisa filtrar explicitamente quem vai votar. Dá para dar mais peso a quem diz:
vou votar com certeza
não falho eleição
estou muito interessado
Isso muda o retrato. E muda a notícia.
E se o contratante sabe em qual perfil está o seu voto mais provável, ele sabe qual modelo de comparecimento pedir.
4.7 Mudança de ponderação entre rodadas: movimento artificial
Você publica rodada 1. Depois publica rodada 2.
O público acha que o eleitor mudou. Mas às vezes quem mudou foi o motor.
Uma troca de critério de ponderação produz variação de 2 a 4 pontos com cara de tendência.
Não é mentira. É direção invisível.
5) A manipulação da margem de erro nos recortes
Esse é o golpe mais comum.
A pesquisa tem 2000 entrevistas.
Anunciam margem pequena no total.
Aí dizem:
“Candidato dispara entre evangélicos.”
“Candidato domina no interior.”
“Candidato desaba entre jovens.”
SACOU? JÁ VIU ISSO?
Só que o recorte tem 400. Ou 300. Ou 200.
A margem naquele segmento é muito maior.
O disparo de 4 pontos vira ruído. Mas a manchete vira fato.
E o contratante não quer precisão. Ele quer efeito.
6) Geografia, logística e o mapa do voto
A coleta é corpo. E corpo tem endereço e horário.
Ponto de fluxo em bairro nobre não é o mesmo que em periferia.
Coleta às 12h não é o mesmo que às 16h.
Condomínio fechado não é o mesmo que rua aberta.
E tem mais. “Não vamos entrar em área de risco.” AQUI É BRASIL, PÔ.
Pode ser prudência. Pode ser veto geográfico disfarçado de segurança.
Excluir território é excluir perfil. E perfil excluído não vota na sua planilha.
7) Priming: a pergunta que prepara a resposta
O questionário pode ser neutro. Ou pode ser uma rampa emocional.
Você pergunta sobre:
preço dos alimentos
medo de perder benefício
corrupção
violência
ameaça institucional
E logo depois pergunta intenção de voto.
Você não precisou mudar o voto. Você só escolheu qual emoção estava no volante naquele minuto.
8) Quer se proteger? Pare de discutir número
Discuta interesse. PEGUE A MÉDIA DE TODOS OS INSTITUTOS.
[…]
O ponto que você deve se perguntar sempre:
Quem contratou.
Quantas vezes contratou.
Com qual frequência.
Em quais momentos.
Porque o cliente tem grande interesse nisso.
Viabilizar candidato.
Desviabilizar adversário.
Acalmar financiador.
Empurrar aliado para a chapa.
E o detalhe mais perverso:
Mesmo que exista intenção, quase sempre é difícil provar. Eu diria que é quase impossível.
Porque o instituto vai chamar de escolha técnica. E escolha técnica tem aparência de ciência.
9) Quer pesquisar você mesmo?
Como checar os softwares especializados nisso, sem citar nomes aqui.
Veja bem, o recurso de ponderação pós-coleta é necessário, OK? O problema é quem opera e qual é o cliente.
Se você quer ver com seus próprios olhos, pesquise no Google pelos termos técnicos abaixo e abra a página do fabricante na seção Features, Capabilities, Modules, Technical specs, Weighting.
1) Coleta
Procure:
CATI software (telefone)
CAPI software (presencial em tablet)
CAWI platform (online)
2) Tabulação e relatório
Procure:
crosstab software
survey tabulation software
weighting module
rim weighting ou raking
Na lista de recursos, veja se existe:
metas por perfil e ajustes por iteração
critério de convergência
limites de peso mínimo e máximo
pesos aplicados em recortes e dashboards
3) Motor estatístico
Procure:
complex survey analysis software
survey procedures STRATA CLUSTER WEIGHT
svy survey commands
post stratification e raking weights
Na parte de recursos, veja se fala em:
desenho amostral com pesos, estratos e conglomerados
variância para amostra complexa
pesos replicados e tamanho efetivo
E por fim:
EU NÃO ESTOU DESCREDIBILIZANDO TODOS OS INSTITUTOS. ALGUNS SÃO EXCELENTES
Pesquisa é ferramenta importantíssima. Pode ser ferramenta séria. Pode ser ferramenta de viabilização.
Quer proteger sua opinião?
Veja quem é o contratante. Veja o histórico de contratos. Veja o que ele ganharia com um empurrão discreto que cabe no rodapé.
E UM AVISO IMPORTANTE
Para quem gosta de bravata.
Eu conheço TODOS os padrões.
Conheço TODAS as manobras.
Inclusive as comerciais.
Conheço o jogo.
Não venham me irritar.
O que eu descrevi aqui é o leve. É o básico. O resto eu deixo guardado.
Abraços.



